sábado, 5 de janeiro de 2013

O Verso do Avesso




Estive pensando em toda dor que disseminei no mundo. Não era pouca! Sempre atribuí essa culpa aos astros. Meu signo não era um dos melhores.  No fundo sabia exatamente que tipo de pessoa se escondia por trás das belas palavras, dos movimentos aleatórios das frases de efeito, das deixas, das saídas e ausências premeditadas, das mentiras, das inverdades, dos eufemismos, das lacunas, da prolixidade inútil, das acepções desmedidas e involuntárias.

Sabia da leviandade da voz, do desespero do gesto, da razão vazia de sentido, pois o sentido descoberto já era parte de uma verdade a sangue frio, a queima roupa que insuportavelmente batia à porta da mente lívida e consciente do próprio estado degenerado de uma alma enrugada, velha, inusitadamente putrefata escondida em alguma gaveta cheia de naftalina.

Não fosse isso seria diferente? Teria de volta os anos da inocência? Teria de volta o ar quente e leve, o cheiro seco de toda coisa nova? Não. A resposta me dou de imediato: não sei e nunca vou saber porque a vida não tem ensaios. Tudo já é o espetáculo, onde improvisamos um papel que nos é imposto. Não somos o que queremos ser! Talvez nos escondemos na criação desse ser virtual, mas não suportamos sequer conviver com a falsidade de um avatar e o confronto inevitável com o verdadeiro eu.

Dito isso, sinto reconhecer - na verdade é só o que resta - que a dor que causei ao mundo não é culpa da natureza inerte dos signos, nem da sociedade que corrompe, nem da índole do sujeito incauto, é culpa única e exclusivamente do conjunto obscuro que compõe meu eu. Da associação desmedida de procedimentos escusos e um toque refinado de ironia para metamorfosear o escarro em ouro fluido e precioso. Como proceder agora frente a tal constatação? Permanecer com os mesmos movimentos aleatórios, das frases de efeito, das mentiras, dos eufemismos... ou prosseguir na lamuriosa busca por redenção? Existe redenção ou apenas uma tentativa de novas fantasias, a busca desesperada por negar a si mesmo e viver o mesmo espetáculo insano da ilusão?

Eis a uma questão capciosa!

End Game




No fim, quando chega ao fim mesmo, não há beijo de despedida. Não há nenhuma música romântica tocando enquanto se afastam... apenas um zumbido surdo e irritante que não cessa nunca. Nunca!

Os números não precisam ser apagados do celular, pois já estão na memória de qualquer forma. Apenas não se quer ligar mesmo, não tem mais por que! A devolução de pertences alheios se faz sem cerimônia. Por um amigo ou uma amiga em comum. O que der. O resto não se faz questão. Perfis sociais modificados por frases que alcancem de alguma forma o outro, do outro lado. Ora que machuquem, ora que façam refletir... 

A casa vazia, cheia de lembranças despedaçadas. A alma vazia, cheia de hematomas metafísicos, enrugada, acuada em algum lugar do estômago que dói... (preciso daquelas pastilhas para gastrite...)

O amor, sentimento puro e verdadeiro, cede à frustração e ao constrangimento. Busca-se rotas de escape, fugas, paliativos, algo que preencha, nem que seja só por uma noite, o vazio deixado pelo outro. Busca-se apenas, sem perspectiva de encontrar de fato. Não há muito a ser feito, a não ser parar de esperar.

Os finais de semana que eram vazios tornam-se terrivelmente vazios. Os dias preenchidos por ligações preocupadas são bruscamente finalizados com um “the end” gigante. Entre um copo e outro, entre um corpo e outro, entre um filme e outro, entre um beijo e outro: apenas o torpor e a mesma hanseníase sentimental de uma vida sediciosamente estranha. 

A vida segue cambaleante. Como um ébrio que não consegue sustentar a si mesmo. Ambos livres para escolherem suas próprias escolhas... percorrer seus próprios caminhos. Se cada segundo foi uma eternidade, observemos o que vem pela frente.

Complexidade ou a busca da bifurcação do vácuo emocional




Era hora de seguir. A passos lentos, sim, a passos lentos!

Era o momento certo de fugir, desistir. A hora exata de não buscar. Quando se busca o outro a possibilidade de frustração aumenta potencialmente. O inferno é o outro. O paraíso é o outro. 

O entretempo de não busca é eterno. É maçante, é anacrônico: o tempo é a telófase de si mesmo e gera uma distensão insuportável:  um paradoxo.

Esse vácuo de emoções, entretanto, é lamentavelmente necessário. Ele é o ventre gerador de matéria. De novidade. De existência. O vácuo emocional é a fração eterna do segundo que antecede o Big-Bang - esse que transforma tudo que não é em existência levemente superior. É quando as coisas voltam a fazer sentido, pois o tempo novamente segue sua trajetória caótica, porém, perceptível.

Ir em frente é importante quando permanecer é insuportável: ir em frente é importante quando não existe tempo, só para ter a sensação – meros impulsos elétricos via neurotransmissores – de estar vivo num mundo feito de sensações. 

Um dia (e pode ser que esse dia nunca chegue no tempo que nos é dado para estar no mundo de sensações) um devastador Big-Bang da início a marcha inexorável do tempo e do espaço, e tudo que era vácuo é preenchido com as mais quentes e belas possibilidades de vida, pois é justamente no meio do caos que nasce o novo. No desequilíbrio que surge a novidade e tudo que era vácuo não passa de lembranças risíveis.