terça-feira, 10 de dezembro de 2013

INCONGRUÊNCIA OU A DANÇA DOS DRAGÕES INEXISTENTES


           Não era exatamente um desejo de autodestruição o que ele sentia. Poderia ser uma tentativa frustrada de chamar atenção, ou apenas tédio mesmo. O desespero sim era real. Tinha certo ar de ansiedade nos gestos... uma inconstância na voz... uma insegurança ébria que beirava a decadência. Na verdade era um cenário todo feito para a decepção. Um palco armado para o soterramento do ego, do orgulho e dos dedos.
                Não fosse o instinto de autopreservação, certamente se jogaria de qualquer precipício sentimental sem fundo. Uma queda eterna rumo a lugar algum e sem possibilidade de volta aparente. Esses sentimentos escondidos... essa agonia enclausurada há tempo tem o mesmo poder devastador dos dragões da mitologia: quando sobem à superfície, Emergem, sobrevoam de forma bela, como uma dança sincronizada, mas quando plainam destroem tudo o que tocam. Expelem fogo e fumaça, inebriam e justamente por isso precisam ficar presos em algum lugar... numa caverna repousando e quiçá jamais retornarem à superfície.
                É evidente que não é o caso aqui. O drama das palavras, o jogo sínico da prosódia causa apenas uma esfera de ilusão: descortina-se as figuras de linguagens, os artifícios estilísticos e os recursos metalinguísticos e o que resta é exatamente o esqueleto fossilizado do que um dia foi reluzente e flamejante. Que um dia foi quente e belo e novo, mas que agora sequer ficou fagulha...
                Apesar de tudo, a vida que planejou em três segundos, que arquitetou cada detalhe que pôde em apenas três palavras se esfacelou no vento e ninguém mais soube da sua existência. Parece que o dragão voltou ao descanso após um sobrevoou de destruição. Ele (o dono dos sentimentos irrequietos) não atribuiu culpa. Não acusou ninguém e muito menos amaldiçoou os signos dos zodíacos... apenas seguiu um roteiro que os astros já haviam traçado.